O sistema jurídico é baseado em silogismos. Por exemplo:
João matou José. Se alguém matar outro, deve ser preso. Logo, João deve ser preso. São duas afirmações que levam a uma conclusão.
Agora veja essa: Os homens vivem mais tempo do que há quinhentos anos. Os homens comem mais chocolates. Logo, os homens vivem mais tempo porque comem mais chocolates? A conclusão é falsa, pois são duas afirmações que não têm relação entre si, mesmo que sejam verdadeiras.
Agora, vamos entender como funciona o raciocínio das ciências sociais quando falam sobre as pesquisas envolvendo a convivência equilibrada dos pais separados com os filhos. Dizem que a criança precisa ter um referencial de moradia. Que dormir em diferentes casas de forma rotineira confunde os pequenos. Porém, partem de uma conclusão que se baseia em afirmações não inter-relacionadas.
Devemos entender que cada indivíduo possui uma jornada de amadurecimento única. Assim como cada núcleo familiar possui sua própria dinâmica de relações.
A maioria dos conflitos pela custódia dos filhos se originam nas dificuldades dos adultos em lidar com frustrações, bem como seus traumas familiares que carregam desde a infância. Quando se diz que a moradia em duas casas é prejudicial para os filhos, está se fazendo uma conclusão equivocada.
A falta de rotina e de referência física que supostamente os infantes sofrem, decorrem dos problemas de maturidade dos adultos e das dificuldades em serem contrariados.
As pesquisas, supostamente científicas, de que a moradia alternada prejudica os filhos baseiam-se em fatos e informações que analisam os cenários sem considerar as individualidades.
Quando uma criança demonstra problemas com sua rotina, não significa que a causa esteja nas idas e vindas da casa do pai e/ou mãe. Está, na verdade, nos problemas específicos daquelas pessoas, em especial nos adultos que a cercam.
A rejeição de um formato de convivência familiar de modo preliminar, como tem feito o Judiciário, baseia-se em premissas não relacionadas. A guarda alternada pode dar certo e não deve ser descartada com base em análises prévias e superficiais. A convivência igualitária de tempo com os pais pode ser benéfica, pois contará com as figuras materna e paterna mais seguida.
O que determina o êxito em cada núcleo familiar é a vontade genuína dos adultos e suas capacidades em lidarem com insatisfações.
O termo guarda alternada não é o mais adequado para ilustrar a convivência equilibrada de tempo entre pais separados. Ele dá a entender que a guarda ora é de um, ora é de outro. Nem deveria ser utilizada a expressão “guarda”, pois filhos não são objetos para serem guardados.
Há quinze anos, quando falávamos para um juiz de família que se queria a guarda compartilhada, éramos motivo de deboche. Diziam que isso apenas existia no mundo das ideias, que era preciso uma excelente relação entre os pais. E que, mesmo assim, logo adiante surgiriam conflitos. Atualmente, a comunidade jurídica mudou de entendimento. Ao menos finge aplicar a nova lei e coloca nos acordos que as responsabilidades parentais serão compartilhadas.
Há trinta anos, não se falava em formalizar relacionamentos familiares entre pessoas de mesmo sexo e muito menos que pudessem adotar crianças. Hoje é algo aceito com tranquilidade.
A cultura é dinâmica e vai se adaptando conforme evolui a sociedade.
Daqui alguns anos, como o Judiciário lidará com a guarda alternada e principalmente com a convivência equilibrada de tempo dos filhos com os pais? É provável que esteja naturalizada e estejamos em outra batalha. Porém, como ficarão as crianças de hoje que estão perdendo uma oportunidade valiosa? É triste quando vemos decisões antigas que negavam direitos hoje pacificados.
O sistema jurídico é uma abstração. Assim como as demais ciências sociais, pois existem apenas como uma ficção coletiva aceita por todos. Não é algo presente no mundo físico. Como um conceito imaginado, está sujeito a interpretações. Por isso, é fundamental que os adultos de hoje lutem para que seja naturalizado o quanto antes o direito de ser tentada uma convivência paritária dos pais separados com a prole. Se eventualmente não der certo em algumas famílias, deve ser olhada a dinâmica específica daquelas pessoas, em vez de culpar o formato genericamente.
Por fim, entendo que o termo guarda alternada não é o mais adequado para ilustrar a convivência equilibrada de tempo entre pais separados. Ele dá a entender que a guarda ora é de um, ora é de outro. Nem deveria se usar a expressão “guarda”, pois filhos não são objetos para serem guardados. A responsabilidade deve sempre ser compartilhada. Sendo que a regulamentação de uma rotina de convivência dos filhos menores deve ser distribuída de forma igualitária. Se não forem em dias alternados, pode-se usar outros formatos. Um que parece bem fácil de assimilar quando os filhos já passaram da primeira infância é o 5-2-2-5: dois dias na semana com cada um (segunda e terça com um, quarta e quinta com outro) e finais de semanas alternados (sexta à segunda).