Quando os pais são separados e o filho mora com um deles, qual a idade ideal para começar o pernoite na casa do outro? O bebê que amamenta pode dormir na casa do pai? Como conciliar a fase de lactação com a convivência paterna?
A resposta para essas perguntas, como na maioria dos casos em Direito de Família, depende de alguns fatores. Não existe uma idade certa para o filho começar a dormir na casa do pai. Cada situação é única. Cada família tem as suas histórias de convívio e de vínculos. Devem, portanto, ser avaliadas as peculiaridades individuais.
Saiba quais os fatores que influenciam na fixação do pernoite na casa do outro pai/mãe. Sempre levando em conta o que for melhor para a criança:
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Adaptação e Vínculo preexistente: Pesa muito o quanto o filho já está acostumado com o outro pai. Se já existe um vínculo entre eles ou se precisará ser construído. Por exemplo, se o pai já exercia a função de cuidador do filho antes da separação, o pernoite será mais tranquilo para o bebê/criança. Na prática: Como é a relação da criança com o pai com quem ela não mora? Existe uma boa relação entre o filho e o pai? Como é a infraestrutura e o aconchego na casa de quem quer pernoitar com o filho? O local possui telas de proteção? A piscina é protegida? O carro em que a criança será transportada possui cadeirinha adequada?
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Assiduidade e Pontualidade: É necessário que a convivência seja constante e consistente para que a criança crie ou reforce o seu vínculo de confiança com o outro adulto. Desde o nascimento do filho, o pai não residente deve manter uma rotina de convivência. Na prática: O pai comparece a todos os seus dias de visitas? O pai pega e entrega a criança no horário combinado?
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Desenvolvimento da criança: Será considerado também em que fase de desenvolvimento afetivo, físico e social a criança se encontra. Ela ainda está sendo amamentada? Ela já caminha, já fala? Qual é a sua capacidade de adaptação a novos ambientes? A convivência com o outro pai deverá ser sempre estimulada, respeitando-se as necessidades da criança. No caso de amamentação nos primeiros meses de vida, por exemplo, recomenda-se que a convivência seja sem pernoite. Adaptando-se aos horários em que a criança amamenta, para que não haja prejuízos de saúde.
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Progressividade: Normalmente, a convivência será construída de forma gradual. Inicia-se uma fase de convivência de algumas horas. Após, aumenta-se o tempo, até evoluir para o pernoite. É importante que os dois pais respeitem a assiduidade e a pontualidade para que a progressão aconteça de forma mais rápida. Uma vez que depende da adaptação da criança com a nova situação. Caso encontre embaraços, deve procurar auxílio legal e não se acomodar com o distanciamento imposto pelo outro.
Em geral, o pernoite tem sido fixado a partir dos dois anos de idade. Podendo ocorrer antes ou depois, ao serem avaliados os fatores explicados acima. Por que aos dois anos?
Além da amamentação, que é recomendada até os dois anos de idade pela OMS, existe o aspecto psicológico do desenvolvimento infantil. Os bebês fusionam-se com seus cuidadores consistentes até, aproximadamente, os dois anos de idade. Em geral, a mãe que exerce essa função.
Segundo a psicopedagoga Laura Gutman, “Este estado fusional das crianças vai diminuindo com o passar dos anos, à medida que seu ‘eu sou’ vai amadurecendo em seu interior psíquico e emocional. Mas cabe destacar que uma criança que foi levada a suportar grandes separações quando era muito pequena tenderá a permanecer em relações fusionais por muito mais tempo. (…) As crianças dão o grande salto por volta dos 2 anos, 2,5 anos. É quando dão início, naturalmente, a sua lenta separação emocional. O que acontece nesta fase? Começa o desenvolvimento da linguagem verbal.“¹
Os pernoites são inevitáveis e saudáveis para a criança. Portanto, o ideal é que seja construído aos poucos, com a paciência e respeito de ambos os pais.
A progressão no formato de convívio paterno não depende da boa relação entre os adultos, mas da qualidade do vínculo de cada um com a criança. É importante saber diferenciar se a criança está apegada à mãe ou se já superou essa fase e é a mãe quem permanece apegada ao infante. Aspectos ambientais como épocas de frio ou calor, aspectos de saúde como alergias ou alimentação especial não impedem o pernoite fora da sua residência habitual. O fundamental é que as transições da casa de um cuidador para outro respeite essas circunstâncias e eventuais instruções médicas. Por exemplo, se for um período de muito frio, combinar da troca ocorrer mais cedo, o inverso quando se está muito calor. Quando precisa tomar leite especial, combinar de enviar a porção necessária ou do outro já manter uma lata suplementar em sua moradia.
Como a JUSTIÇA tem decidido?
Vamos comentar alguns casos decididos pelo Judiciário.
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Medida Protetiva não impede a visitação:
O Tribunal do Rio Grande do Sul entendeu que o fato de existir uma Medida Protetiva da Lei Maria da Penha proibindo o pai de se aproximar da mãe não seria motivo para impedir a convivência dele com o filho. Como era uma criança pequena e não havia prova de risco para ela, decidiu que o pai poderia pegá-la para ficar durante o dia, sem pernoite. (Fonte: AI Nº 70073644155, 8ª. CC – TJRS, Julgado em 28/09/2017).
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Visitas sem pernoite aos três meses de vida:
O Tribunal do Rio Grande do Sul concedeu direito de convivência do pai com a filha de três meses de vida. Fixou em finais de semanas alternados, sem pernoitar, mas passando três horas no sábado e mais três horas no domingo, a fim de respeitar os intervalos de amamentação. (Fonte: AI Nº 70074738790, 7ª. CC – TJRS, Julgado em 27/09/2017).
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Visitas com pernoite para criança de 1 ano e seis meses, com adaptação inicial de três meses:
Em outro caso do Tribunal do RS, foi concedido direito de convivência paterna com pernoite para o filho de um ano e seis meses de idade, pois não havia contraindicações e houve um período de adaptação inicial de três meses. (Fonte: AI Nº 70072785454, 8ª. CC – TJRS, Julgado em 14/09/2017).
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Visitas sem pernoite para criança de 2 anos, necessidade de verificar a dinâmica familiar:
Em mais um caso do TJRS, foi negado o direito de pernoite do pai com a filha de dois anos, pois entendeu necessário que primeiro fosse realizada a avaliação profissional por assistente social para verificar a dinâmica familiar. (Fonte: AI Nº 70073997058, 7ª. CC – TJRS, Julgado em 30/08/2017).
CONCLUSÃO
Diante disso, costumamos recomendar aos pais separados que tentem negociar um Pacto de Parentalidade com convivência paterna progressiva, em que se fixam obrigações recíprocas e metas que garantirão a ampliação ou eventuais sanções em caso de descumprimento. Quando não se chega a esse entendimento, é preciso que uma das partes busque a Justiça. Isso, para que um juiz determine o formato inicial e eventuais progressões. Entregar as decisões do seu filho para um terceiro acaba sendo danoso para todos, o que justifica a negociação prévia ao litígio.
¹ GUTMAN, Laura. A Maternidade e o encontro com a própria sombra. 13a. Edição. São Paulo: Best Seller, 2016.
Créditos:
Redação: Ana Carolina Silveira e Adriano Ryba.
Revisão e Imagens: Ana Carolina Silveira e Júlia Cadore.
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